Índice
O dia 04 de Fevereiro foi instituído como o Dia Mundial de Combate ao Câncer. A data foi definida pela União Internacional para o Controle do Câncer (UICC) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Essa iniciativa, vem desde 2005, com o objetivo conscientizar e mobilizar a população mundial no combate ao câncer. Uma ação conjunta entre governos e população, poderia frear impactos decorrentes da doença, pois a maioria dos cânceres podem sim ser evitados.
Para saber porquê, vamos falar um pouco sobre as bases moleculares do câncer, acompanhe.
Câncer: a doença dos genes
Podemos dizer que mutação é a matéria prima da evolução. Elas podem ser fundamentais para a adaptação de um organismo, ou podem ser prejudiciais causando até a morte do indivíduo. Na maioria das vezes, as mutações são eliminadas, passando despercebidas.
Em outros casos, podem ativar oncogenes e inativar genes supressores de tumor. Esses genes, têm papel fundamental no controle do ciclo celular, tanto na mitose e meiose.
Proto-oncogenes atuam de forma positiva no progresso do ciclo celular, enquanto que genes supressores de tumor atuam de forma negativa, parando o ciclo celular para correções, caso haja erros na replicação do DNA.
Um supressor de tumor que sofre mais mutação em caso de câncer, é o gene TP53, em 50% dos casos, o gene está alterado.
O produto desse gene, a proteína p53, está envolvida na parada do ciclo celular, apoptose e etc. A proteína p53 entra em atividade em caso de estresse celular. Alguns exemplos de proto-oncogenes e genes supressores de tumor são mostrados nas Tabelas 1a e 1b respectivamente.
OBS: Define-se como proto-oncogene a versão normal dessa classe gênica. Após a mutação, ele passa a ser definido como oncogene.
A literatura reporta que a formação de tumor se origina quando essas classes de genes sofrem alterações. São as chamadas Drivers Genes mutations, pois elas promovem vantagens adaptativas e a célula cresce de forma desgovernada e sem a atividade da p53, o tumor se instala.
Não custa relembrar que para a célula se dividir, é preciso que o DNA se replique e é na replicação do DNA, que erros podem ocorrer. Tudo deve ser muito bem orquestrado, pois são várias enzimas e proteínas trabalhando em momentos específicos.
As células recebem sinais químicos para se dividir e também para parar de se dividir. Entre as etapas de divisão, existem pontos de checagem, ou checkpoints e no caso de células cancerígenas, esses mecanismos são inexistentes.
Mas…meu DNA possui 3 bilhões de pares de base, como vou protegê-lo dos eventos mutacionais?
Origem do câncer
Erros de replicação do DNA, não são tão frequentes assim, as enzimas que adicionam nucleotídeo tem uma taxa de fidelidade alta. Também, no momento da replicação uma das fitas do DNA é usada como molde para a síntese da segunda fita.
Dessa forma, se não houver a complementaridade entre os nucleotídeos, o erro fica evidente e enzimas de revisão detectam e corrigem o possível erro.
Ocorre que, com o passar dos anos, esses mecanismos ficam menos eficientes, além de ficarmos mais expostos aos agentes cancerígenos.
A exposição aos agentes cancerígenos ou os carcinógenos, aumentam as chances de erros durante a replicação do DNA.
Substâncias químicas, podem conter análogos de base que são inseridas no DNA no lugar de nucleotídeos ou podem também gerar outras substâncias nocivas e que danificam a estrutura do DNA.
Raios αβγ, geram radicais livres que também danificam a estrutura do DNA e fatores biológicos, como os vírus que podem inserir seu material genético no DNA humano, inativar e ativar genes específicos.
Alguns exemplos de carcinógenos podem ser evitados, pois são fatores externos ou ambientais agressivos ao material genético.
Câncer hereditário
O câncer hereditário, ocorre nas células germinativas (espermatozoides ou ovócitos) e pode ser passado aos descendentes no momento da fecundação. Relembrando que o ser humano é um organismo diplóide, portanto, os genes estão aos pares.
Na formação dos gametas, 23 cromossomos estarão presentes, assim sendo, se um dos gametas estiver carregando um alelo mutado, o zigoto recebe a herança defeituosa.
No caso, em que apenas um alelo do zigoto é portador da mutação, não quer dizer que o indivíduo que o recebeu, desenvolverá câncer.
O indivíduo portador do alelo mutado, tem uma susceptibilidade maior em desenvolver o câncer, quando comparado ao indivíduo que não tem o alelo mutado. Essa susceptibilidade irá variar em função do alelo defeituoso, tipo de mutação, extensão e o gene mutado.
Dependendo do gene, o alelo funcional é suficiente para suprir as necessidades da célula. Em outros casos, um alelo mutado é suficiente para desencadear o processo cancerígeno. No caso dos oncogenes, basta que um alelo esteja mutado para o portador desenvolver câncer.
No caso dos supressores tumorais, os dois alelos precisam estar mutados para que o indivíduo desenvolva o câncer.
Câncer hereditário responde por apenas 10% dos casos de câncer, considerando que temos aproximadamente 10 trilhões de células, não é de se esperar que câncer hereditário seja um evento frequente.
Mas os portadores de câncer hereditário, tem 50% de chance de passar a anomalia aos descendentes. Uma outra característica desse câncer, é que os portadores desenvolvem a patologia em idades precoces, geralmente até os 45 anos.
Câncer esporádico
Ocorre nas células somáticas do corpo e representam aproximadamente 90% dos casos de cânceres e ocorre de forma espontânea, influenciado principalmente pelos carcinógenos, como os mostrados na tabela 2. Devemos mencionar que o câncer pode ocorrer em qualquer parte do corpo, mas alguns órgãos são mais afetados que outros.
Estatísticas do Câncer
Em 2020, o banco de dados GLOBOCAN estimou mais de 19 milhões de novos casos de câncer ao redor do mundo. Desses casos, 49,3% se concentram na Ásia; 22,8% na Europa; 13,3% América do Norte; 7,6% América Latina e Caribe; 5,7% na África.
Muitos aspectos podem influenciar, mas esses dados nos indica uma relação do câncer com o ambiente. Culturas diferentes, os hábitos de diferentes povos, influenciam diretamente nas diferenças observadas.
Para clarificar melhor essa relação (fator externo e câncer), podemos verificar no gráfico 1 que mostra os 12 tipos de câncer que mais acometeram homens e mulheres em 2020, no Brasil.
Câncer de pulmão, estômago, bexiga, esôfago, fígado são mais incidentes em homens do que em mulheres. Já a tireóide é mais incidente em mulheres. Todas as diferenças observadas, exceto àquelas que diferem pela anatomia, são em função de hábitos adotados e isso nos mostra a influência ambiental.
Políticas de conscientização e o câncer
Os fatores ambientais ou fatores externos, influenciam fortemente no aumento dos casos de câncer. Tendo isso em mente, uma ação combinada com políticas públicas de conscientização e prevenção, são fundamentais para a redução dos casos de câncer.
Atitudes simples e conscientes poderiam diminuir muito do sofrimento humano direto e indireto, além do mais, reduziria também impactos econômicos associados à doença.
Algumas medidas podem ser tomadas para a contenção do avanço dos casos de câncer, vejamos algumas delas:
- Não fumar;
- Dieta saudável, rica em frutas, verduras, vegetais e leguminosas;
- Manter o peso corporal adequado;
- Praticar exercícios físicos;
- Mulheres entre 25 a 64 anos, fazer o exame anual, preventivo do câncer de colo de útero;
- Vacina contra HPV: Meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14 anos;
- Vacine contra a hepatite B;
- Evite a ingestão de bebidas alcoólicas;
- Evitar comer carne e outros alimentos processados;
- Evite a exposição ao sol entre 10h e 16h, e use sempre proteção adequada, como chapéu, barraca e protetor solar, inclusive nos lábios;
- Evite exposição a agentes cancerígenos no trabalho;
- Exame de próstata com frequência, em homens a partir dos 40 anos.
Testes genéticos
A detecção precoce é fundamental para o sucesso de um tratamento contra o câncer. Casos que existam câncer familiar, um aconselhamento genético pode ajudar. Nesse caso, testes genéticos detectam mutações específicas herdadas.
Indivíduos com casos de câncer precoce na família, devem se cuidar com mais rigor, uma vez que ele pode ter a susceptibilidade aumentada para a doença.
Quanto antes descobrir qual ou quais os genes estão mutados, caso haja alguma anomalia, maiores serão as chances de prevenção, em função da escolha das melhores estratégias a tomar.


Referências
Griffiths, A. J. F., Wessler, S. R., Lewontin, R. C., & Carroll, S. B. (2006). Introdução a Genética. In Guanabara Koogan.
Pon, J. R., & Marra, M. A. (2015). Driver and passenger mutations in cancer. Annual Review of Pathology: Mechanisms of Disease. https://doi.org/10.1146/annurev-pathol-012414-040312
Simmons, S. &. (2013). Fundamentos da genética. Journal of Chemical Information and Modeling.
Tomczak, K., Czerwińska, P., & Wiznerowicz, M. (2015). The Cancer Genome Atlas (TCGA): An immeasurable source of knowledge. In Wspolczesna Onkologia. https://doi.org/10.5114/wo.2014.47136
Vogelstein, B., Papadopoulos, N., Velculescu, V. E., Zhou, S., Diaz, L. A., & Kinzler, K. W. (2013). Cancer genome landscapes. In Science. https://doi.org/10.1126/science.1235122
https://www.inca.gov.br/