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O câncer de tireoide é o terceiro tipo de câncer mais frequente entre as mulheres do sudeste e nordeste do Brasil e suas causas são diversas. A radiação ionizante e a alimentação podem fazer com que um indivíduo adquira mutações em genes importantes, ao passo que algumas variantes genéticas relacionadas ao desenvolvimento da doença podem ser herdadas.
Quer entender melhor o câncer de tireoide? Além de descrevê-lo, nosso novo texto também aborda a classificação dos carcinomas de tireoide, a etiologia da doença e sobre marcadores moleculares utilizados no diagnóstico.
O que é o câncer de tireoide?
O câncer de tireoide é a malignidade mais comum do sistema endócrino. Como sugere seu nome, ele acontece na tireoide, uma pequena glândula endócrina, localizada na porção medial do pescoço, responsável pela produção de hormônios essenciais à manutenção do metabolismo.
Segundo o Observatório Global do Câncer (GLOBOCAN), a incidência do câncer de tireóide em 2020 foi de aproximadamente 590 mil casos. Além disso, a taxa de incidência deste câncer, no Brasil, é uma das mais elevadas do planeta, juntamente com Estados Unidos, China, Canadá, Austrália e outros.
Como veremos na sequência, o câncer de tireóide manifesta-se de diferentes maneiras, uma vez que ele pode emergir de diferentes grupos celulares.
Tipos de Câncer de Tireoide
Os cânceres da tireoide são classificados de acordo com a porção histológica na qual os tumores se originam, sendo que as células papilares são as mais comumente afetadas, em uma manifestação chamada de Adenocarcinoma Papilar (PTC, do inglês Papillary Thyroid Cancer).
Além das células papilares, os tumores também costumam se originar nas células foliculares, dando origem ao Adenocarcinoma Folicular (FTC, do inglês Follicular Thyroid Cancer). Quando somados, o PTC e o FTC respondem por mais de 90% dos casos de câncer de tireoide.
Coletivamente, os adenocarcinomas mencionados são chamados de Carcinomas Diferenciados da Tireoide (CDT). Eles são assim chamados devido ao fato dos tumores manterem um alto nível de semelhança com o tecido normal.


Isso é relevante pois, em todo tipo de câncer, a anaplasia (ou perda da diferenciação celular) é um importante aspecto para a classificação da malignidade e, consequentemente, para o estadiamento do câncer.
Os carcinomas anaplásicos da tireoide, portanto, são mais agressivos e severos que os CDT, embora sejam menos comuns (~2% de todos os tumores malignos da tireoide). Em geral, eles também surgem de células foliculares e papilares neoplásicas, ou seja, de cânceres da tireóide preexistentes no indivíduo.
Por fim, os Carcinomas Medulares de Tireoide representam cerca de 5 a 10% de todos os carcinomas da tireoide. Estes são tumores neuroendócrinos, originados em células parafoliculares, também chamadas de células C, responsáveis pela produção de calcitonina.
Como surge o câncer de tireoide?
A etiologia do câncer de tireoide é complexa e multifatorial, envolvendo, em geral, fatores ambientais, como a dieta e a exposição a agentes carcinogênicos, e também fatores hereditários.
A exposição à radiação externa na região cervical é uma das causas mais conhecidas do câncer de tireoide. Os riscos advindos dessa exposição estão relacionados à dose, ao tipo de radiação e ao tempo ao qual o indivíduo foi exposto.
O desenvolvimento da radioterapia foi um importante passo no tratamento do câncer. Além disso, ele permitiu que cientistas concluíssem que doses de radiação ionizante maiores que 40Gy são potencialmente carcinogênicas.
Historicamente, muitos dos moradores de Pripiat no momento do acidente nuclear da usina de Chernobil, desenvolveram câncer de tireoide. Atualmente, estudos epidemiológicos longitudinais apontam que aproximadamente 7% das pessoas que recebem doses de 5 a 10Gy de radiação ionizante desenvolvem câncer de tireoide em um período de latência que pode durar até vinte anos.
Além disso, o conteúdo dietético de iodo é uma das causas ambientais do câncer de tireoide. Uma maior incidência de carcinoma papilífero existe em regiões com alto teor de iodo na dieta, como o Pacífico e a Islândia. Já países com deficiência de iodo experimentam uma maior incidência de carcinoma folicular, além de bócios tireoidianos benignos.
Marcadores moleculares e a herança genética
Marcadores moleculares têm sido investigados para distinguir entre câncer e nódulos tireoidianos benignos. Um exemplo disso pode ser observado no rearranjo RET/PTC (uma fusão da proteína RET com outros gene), encontrado em 20-40% dos carcinomas papilares da tireoide e frequentemente observado em indivíduos expostos à radiação ionizante.
Análises de PTC mostraram genes mutados em 70% dos casos, principalmente BRAF, que é encontrado em cerca de 60% de todos os casos desse carcinoma. A maioria das mutações BRAF mantém a proteína em um estado constantemente ativo, levando a uma atividade mitogênica constante.
As proteínas Ras também possuem um importante papel no desenvolvimento de diversos tipos de câncer, incluindo o de tireoide. Esta é uma superfamilia de proteínas envolvidas com a transdução da sinalização celular e mutações nos genes que as codificam são encontradas em cerca de 40% de todos os Adenocarcinomas Foliculares.
Além das lesões adquiridas nestes genes, algumas variantes genéticas implicadas no câncer de tireoide podem ser herdadas, especialmente quando falamos de carcinomas diferenciados da tireoide (DTC). Adicionalmente, os DTCs podem constituir parte dos casos de algumas síndromes familiares, como as Síndromes de Cowden, de Gardner e também na Síndrome de Werner.
Por fim, o carcinoma não medular familiar de tireoide (CNMFT) é um tipo de câncer de tireoide que exibe um comportamento autossômico dominante com penetrância incompleta e expressividade variável, e é mais agressivo em comparação com DTC esporádico.
Os estudos associativos identificaram vários genes candidatos para FNMTC nos últimos anos, mas as relações de causalidade ainda são um tópico de discussão. Evidências mostraram que 10% dos DTCs têm ocorrência familiar, no entanto, a ausência de testes genéticos na rotina diagnóstica é um entrave para a distinção entre as formas esporádicas e hereditárias da doença.
Referências
Niederhuber, JE.; Armitage, JO.; Doroshow, JH. Abeloff’s Clinical Oncology. Elsevier, 2019.
Lee K, Anastasopoulou C, Chandran C, et al. Thyroid Cancer. StatPearls Publishing, 2022.
Capezzone M, Robenshtok E, Cantara S, Castagna MG. Familial non-medullary thyroid cancer: a critical review. J Endocrinol Invest, 2021.