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Descobertas na década de 90 por Hacker e colaboradores, as Ilhas Genômicas são resultado da Transferência Horizontal de Genes ou, neste caso, de clusters gênicos.
Ao comparar diferentes cepas de E. coli, Hacker e seus colegas perceberam que as variações dos genomas entre uma cepa e outra eram justamente aquelas que conferiam recursos adaptativos.
Você sabe como funciona a Transferência Horizontal de Genes, o que são Ilhas de Patogenicidade, quais suas implicações na saúde humana e como podem ser detectadas? Entenda!
A Transferência Horizontal de Genes (THG)
A Transferência Horizontal de Genes (TGH) é a transferência de material genético de uma célula para outra, que não faz parte de sua prole. Juntamente com as mutações e os rearranjos, a Transferência Horizontal fornece as bases da evolução do genoma bacteriano.
Dentro do contexto bacteriológico, essa transferência de genes acontece a partir de um dos seguintes mecanismos:
- Transdução
- Conjugação
- Transformação
Ainda que nem todo material genético forneça vantagens adaptativas, estes mecanismos são responsáveis pelo surgimento de diversos fenótipos e inovações evolutivas, como é o caso dos genes de resistência aos antibióticos.
Alguns dos genes transferidos de maneira horizontal são os chamados genes acessórios. Diferentemente do core genome que é composto por genes que exercem funções metabólicas básicas e que são compartilhados por todas as cepas de uma mesma espécie, os genes acessórios variam entre diferentes cepas de uma mesma espécie.
Os genes acessórios compõem a parte variável do genoma de diferentes cepas de uma mesma espécie de bactéria.
Genoma central: o core genome refere-se à porção compartilhada por todas as cepas desta mesma espécie. Sendo assim, genes acessórios determinam geneticamente diferentes cepas bacterianas.
Ao unirmos o core genome com o conjunto de todos os genes acessórios presentes em todas as cepas de uma mesma espécie, obtemos o chamado pan-genoma.
Assim, é possível perceber que, em termos filogenéticos, são os genes acessórios que caracterizam a existência de diferentes cepas de bactérias.
Os genes acessórios capazes de conferir melhorias evolutivas para procariotos podem ser encontrados dentro das chamadas Ilhas Genômicas. Sendo assim, é a composição dessas ilhas que explica diferentes patótipos de uma mesma espécie.

O que são Ilhas Genômicas?
Ilhas genômicas (IG) são regiões no genoma compostas por blocos de genes acessórios. Estes genes são adquiridos através da Transferência Horizontal de Genes e oferecem recursos evolutivos para bactérias.
As ilhas genômicas são detectadas a partir da comparação das cepas de uma mesma espécie e possuem algumas particularidades estruturais que as diferenciam do restante do genoma, como seu conteúdo GC (Guanina e Citosina) e a frequência de dinucleotídeos.
Uma vez que as capacidades adaptativas fornecidas pelas ilhas genômicas podem resultar em prejuízos para os hospedeiros humanos, o estudo das IGs concretiza avanços na bacteriologia e também na prática clínica.

Classificação de Ilhas Genômicas
As Ilhas genômicas podem ser categorizadas de acordo com a função exercida pelos peptídeos expressos pelos genes nela contidos. Por exemplo, uma ilha genômica na qual existam genes acessórios capazes de aumentar a virulência de uma determinada bactéria é chamada de Ilha de Patogenicidade.
As Ilhas Genômicas foram descritas inicialmente por Hacker, em 1990. Além do conteúdo GC e da frequência diminuída de dinucleotídeos, as IG também compartilham algumas características comuns que permitem que elas sejam divididas em:
- Ilhas de Patogenicidade, que conferem uma maior virulência às bactérias
- Ilhas Metabólicas, que propiciam vantagens adaptativas metabólicas
- Ilhas de Resistência, capazes de armazenar genes de resistência a antibióticos
- Ilhas de Secreção, cujos genes encodam sistemas de secreção
Todos os quatro tipos de Ilhas Genômicas trazem reflexos para a saúde humana, entretanto, as Ilhas de Patogenicidade são as mais estudadas. Veja a seguir como elas funcionam.
Ilhas de Patogenicidade
As Ilhas de Patogenicidade (PAIs, do inglês Pathogenicity Islands) podem carregar um ou mais clusters gênicos, capazes de serem traduzidos em fatores de virulência.
Os genes capazes de expressar tais fatores de virulência são classificados da seguinte forma:
- Fatores de adesão, como a Fímbria P e a Fímbria S. Estes fatores facilitam a adesão de bactérias às paredes dos tecidos de um organismo hospedeiro.
- Sideróforos, como a Yersiniabactin e a Aerobactin, que facilitam a captação de íons pouco solúveis em água, como o ferro.
- Exo e enterotoxinas, como a alfa-hemolisina e a enterotoxina tipo B, que induzem a apoptose de células eucariontes a partir de diferentes mecanismos.
- Genes de invasão, que permitem a entrada de algumas bactérias em células eucariontes, como os genes inv, presentes em alguns gêneros de Salmonella.
- Sistemas de Secreção do tipo III e IV, que produzem proteínas efetoras capazes de modular a função celular do hospedeiro.
As Ilhas de Patogenicidade explicam a existência de diferentes cepas de E. coli, que geram sintomas muito diferentes nos seres humanos hospedeiros. Por exemplo, cepas do tipo EHEC produzem toxina Shiga, enquanto outras (ExPEC) podem habitar regiões extra intestinais.
A aquisição das Ilhas de Patogenicidade acontece através de um dos mecanismos de Transferência Horizontal de Genes. Após serem captadas por uma bactéria, estas Ilhas Genômicas são incorporadas ao cromossomo bacteriano ou a um plasmídeo, geralmente através de recombinações sítio-específicas.
As Ilhas de Patogenicidade também podem ser desenvolvidas a partir de Elementos Genéticos Móveis através de rearranjos. Essa capacidade de movimentação, entretanto, pode ser perdida com o passar do tempo, permitindo que os genes envolvidos sejam herdados pelos descendentes da célula.
Por fim, as este tipo de IG pode ser modificado novamente por eventos de recombinação, inserção ou excisão e reganhar habilidades de elementos móveis novamente, permitindo que sejam transferidas por THG para outras bactérias.
Como é realizada a detecção de Ilhas Genômicas?
Muitos dos estudos de Ilhas Genômicas são de natureza comparativa. Em função disso, é possível perceber que métodos eficientes para o sequenciamento completo de genomas, como o sequenciamento massivo, são preferidos pelos cientistas.
Além disso, o sequenciamento de nova geração (NGS) também permite o emprego de tecnologias em bioinformática, como é o caso da predição de Ilhas genômicas. As ferramentas de predição são úteis para descobrir se aconteceram inserções ou exclusões de blocos de genes acessórios.
Dessa forma, a predição permite a construção mais adequada de árvores filogenéticas de espécies e cepas de bactérias, além de como diferentes espécies e cepas relacionam-se no cenário evolutivo.
Por fim, a análise rápida e eficiente do conteúdo GC e também da frequência de dinucleotídeos também é viabilizada por métodos de bioinformática, tornando possível a classificação adequada de uma IG.
Conclusão
Ilhas genômicas são adquiridas por Transferência Horizontal de Genes através de distintos mecanismos. Elas são compostas por blocos de genes acessórios e, dependendo da função exercida pelas proteínas traduzidas a partir de tais genes, podem ser classificadas em quatro subgrupos.
As Ilhas de Patogenicidade possuem grande impacto na prática epidemiológica. Isso se dá em virtude do aumento da virulência de uma cepa bacteriana, tornando bactérias — antes inofensivas para humanos —em potenciais causadoras de doenças.
O Sequenciamento de Nova Geração não somente viabiliza os estudos comparativos de Ilhas Genômicas como também permite que análises mais complexas possam ser realizadas com ferramentas de bioinformática.
Referências
- Hacker J, Bender L, Ott M, Wingender J, Lund B, Marre R, Goebel W. Deletions of chromosomal regions coding for fimbriae and hemolysins occur in vitro and in vivo in various extraintestinal Escherichia coli isolates. Microb Pathog. 1990
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