microambiente tumoral

Microambiente Tumoral: Influência na Progressão do Tumor

O microambiente tumoral é a região na qual um tumor interage com outras células e elementos não celulares para desenvolver-se. Entenda!

Alguns tipos de tumores são mais comuns em um gênero ou faixa etária do que outros, assim como alguns são associados à dieta, ao ambiente e ao histórico familiar. Independente do tumor ou da sua causa, é crucial compreender o papel do complexo microambiente tumoral.

No texto, abordaremos a definição de tumores, de microambiente tumoral e qual a relação destes com os processos inflamatórios. Continue a leitura para entender!

O que são os tumores?

Os tumores, também conhecidos como neoplasias, são aglomerados de células que apresentam um crescimento anormal e, consequentemente, aumentam o tecido corporal envolvido. Os tumores podem ser classificados por apresentarem características benignas ou malignas. 

Dessa forma, embora os tumores em geral sejam frequentemente relacionados ao câncer, esta doença é caracterizada pela presença de tumores malignos. Por outro lado, os tumores benignos são mais brandos e comuns, ocorrendo em boa parte da população, como na forma de verrugas, por exemplo.

Como veremos adiante, os tumores malignos (o câncer) passam por diversos eventos que podem culminar na formação invasão de sítios secundários ou metástases e, por isso, possuem um prognóstico pior em relação aos tumores benignos.

Qual a diferença entre tumores benignos e malignos?

Os tumores são considerados benignos quando são bem delimitados, apresentam crescimento lento, não migram para outras partes do corpo e quando removidos cirurgicamente não reincidem. 

Já os tumores malignos apresentam uma autonomia maior, crescimento rápido com capacidade de invadir tecidos vizinhos, além de poder provocar metástases. Vale ressaltar que uma neoplasia maligna é o sinônimo para o que conhecemos como câncer.

Em outras palavras, nos tumores malignos formam-se grupos de células que perderam suas características originais de desenvolvimento resultando em uma massa tumoral com capacidade de invadir tecidos e órgãos.

Estas são capacidades funcionais adquiridas, que permitem a sobrevivência da célula tumoral, através de sua proliferação e disseminação delas. 

Elas foram inicialmente descritas por Hanahan e Weinberg nos anos 2000, sendo separadas em 6 categorias que resumiam os principais pontos alterados nas células tumorais. Entretanto , outras capacidades foram incorporadas ao Hallmark, recentemente republicado por Hanahan em 2022.  

Entre elas, algumas são muito discutidas quando se fala de tumores, como a resistência à morte celular programada, a manutenção dos sinais de proliferação e a imortalidade. Outras ainda estão ganhando seu espaço, como é o caso da inflamação, e do envolvimento do sistema imune

Nomenclatura dos tumores

A nomenclatura utilizada para os tumores benignos é a utilização do sufixo “oma” e o prefixo correspondente ao tecido originário. Exemplo: Hemangiomas, que são tumores vasculares benignos. 

Para os tumores malignos, o nome depende da origem embrionária do tecido, como por exemplo os carcinomas, que representam tumores malignos formados a partir de tecidos de revestimento. Vale lembrar que sempre existem exceções.

Nenhum tumor será igual ao outro, apesar de poderem apresentar a mesma origem existem vários tipos e causas diferentes para que ocorram. 

O que é o microambiente tumoral?

O microambiente tumoral é o ambiente no qual o tumor existe com as células tumorais e outros elementos como fibroblastos, células imunes, fatores solúveis e fatores de crescimento. Ou seja, o microambiente tumoral é o espaço onde as diferentes células e moléculas se associam ao tumor.

Durante muitos anos, o objetivo das pesquisas sobre os diferentes tipos de câncer foi a identificação das mudanças genéticas e/ou fenotípicas das próprias células tumorais, buscando a explicação dessa doença. 

Entretanto, cada vez mais tem se verificado que o microambiente no qual o tumor está inserido tem um papel essencial para a melhor compreensão geral da progressão tumoral. .

Quais são os elementos do microambiente tumoral?

O microambiente tumoral é composto por elementos celulares e não celulares, que interagem entre si e com as células tumorais, afetando o crescimento e a progressão do tumor. Entre os elementos celulares do microambiente tumoral, podemos destacar:

  • Células tumorais
  • Células do estroma – células de suporte, não malignas, que são suporte as células tumorais. Podem variar significativamente entre os diferentes tipos de tumores.
  • Fibroblastos associados ao tumor – células derivadas de fibroblastos residentes no tecido, que superexpressam marcadores associados a características malignas.
  • Células endoteliais – células que auxiliam na formação de vasos sanguíneos.
  • Células imunes – geralmente são células inflamatórias como: linfócitos T e B, macrófagos ou Macrófagos Associados ao Tumor, mastócitos, neutrófilos, células natural killer.

De uma maneira geral, as células não tumorais não apresentam taxas de proliferação desreguladas ou instabilidade genética aumentada, contudo elas são reprogramadas para agir de acordo com essa nova dinâmica tecidual, comandada pelas células tumorais.

Já os elementos não celulares do microambiente tumoral incluem a matriz extracelular, que é composta por proteínas e glicoproteínas que dão suporte e sustentação física para as células tumorais, além de influenciar a sua proliferação e migração.

Outros componentes não celulares do microambiente tumoral são:

·  Matriz extracelular – fornece suporte físico, além de fatores de crescimento fundamentais.

  • Vesículas extracelulares – mediadores críticos do crosstalk entre o tumor e células do microambiente tumoral, através do transporte de moléculas biologicamente ativas que podem promover iniciação, progressão ou regulação da sinalização.
  • Quimiocinas e citocinas – moléculas sinalizadoras produzidas por células tumorais e do microambiente, que afetam o crescimento e comportamento das células tumorais, bem como a resposta imune e inflamatória no ambiente tumoral.
  • Fatores de crescimento – proteínas sinalizadoras que desempenham um papel importante na migração de células imunológicas e na regulação do crescimento e progressão do tumor.

Quais são as funções desses elementos?

As moléculas extracelulares podem atuar principalmente na sinalização negativa e positiva, sendo produzidas pelos elementos celulares presentes nesse microambiente, refletindo em uma rede de comunicação atuante nesses locais.

Somarelli (2021) em um artigo de revisão trouxe uma comparação entre as populações de células tumorais e populações de indivíduos em estado selvagem. 

Onde apresentou diversos aspectos relacionados às características dessas células como, por exemplo, os mecanismos pelos quais as células tumorais modificam substancialmente o seu ambiente e ao fazê-lo influenciam a sua seleção natural.

Dessa forma, o autor defende a hipótese de que características distintas dessas células podem levar a fenótipos-chave que são necessários para a sobrevivência e reprodução do tumor.

Existe relação entre a inflamação e o microambiente tumoral?

A relação está na influências das células inflamatórias sob o desenvolvimento de diversos tipos de tumores, que varia desde o estágio inicial até o metastático.

As células inflamatórias regulam o crescimento tumoral pela meio da angiogênese, remodelação tecidual, supressão imunológica e pela sua presença no microambiente tumoral, na produção de citocinas e quimiocinas, que determinam a progressão no desenvolvimento estimulando a resposta antitumoral.

O processo inflamatório é uma resposta fisiológica do organismo que utiliza de vias biológicas para proteger o organismo contra estímulos adversos, como patógenos, células danificadas e compostos tóxicos, envolvendo os sistemas imunes inatos e adaptativos.

Nessa cadeia de estímulos, a rede fatores pró- e anti-inflamatórios apresentam um forte impacto no desenvolvimento e progressão tumoral.

Quando se fala de inflamação é impossível não mencionar as prostaglandinas (PG), que são conhecidas como mediadores inflamatórios e são geradas a partir da conversão do ácido araquidônico pelas enzimas ciclooxigenases (COX).

As prostaglandinas são lipídeos pro-inflamatórios e imunomodulatórios que contribuem na modulação de vários efeitos pró-tumorais, como a proliferação celular e invasão.

Para sua síntese ocorrer é necessária a ação enzimática da fosfolipase A2 (PLA2) na membrana celular para produção do ácido araquidônico. 

O ácido araquidônico será metabolizado em prostaglandinas pela ação das enzimas COX, em duas etapas: produzindo prostaglandina G2 (PGG2), e depois metabolizando PGG2 em prostaglandina H2 (PGH2), como demonstrado na imagem. 

Microambiente tumoral - superexpressão de COX-2
A indução da COX-2 é uma questão central no tratamento do câncer. Quando superexpressa, essa enzima inibe a apoptose e promove a proliferação celular, bem como a invasão tumoral, portanto, a escolha de medicamentos quimioterápicos é cuidadosamente realizada pelo oncologista, a fim de evitar tais desfechos.

Todos esses fatores podem ser associados aos marcos estabelecidos do câncer comentados anteriormente.

Quando estudados os tumores sólidos, observou-se que o microambiente tumoral com grandes quantidades de moléculas pró-inflamatórias está ligado ao crescimento e agressividade. 

Já na análise em um nível molecular, demonstrou-se que tanto a inflamação quanto ativação de oncogenes podem levar a transcrição de fatores que estimulam a secreção de quimiocinas, citocinas e prostaglandinas.

A inteligência artificial pode ser utilizada para o estudo do microambiente tumoral?

Em uma era na qual o chat GPT vem ganhando cada vez mais espaço junto com diversas outras tecnologias, a inteligência artificial pode e deve ser aproveitada para o estudo do microambiente tumoral.

A análise da inteligência artificial apresenta um grande potencial para o reconhecimento e identificação de padrões em grande quantidade de dados, se tornando uma ferramenta de grande valia para a investigação de microambientes tumorais que tem como característica ser um ambiente altamente heterogêneo e complexo.

Segundo Xiao e Yu (2021), a integração da inteligência artificial será utilizada principalmente para extrair informações quantitativas, através do uso de imagens histopatológicas de lâminas inteiras, citometria de fluxo e de massa, além de abordagens transcriptômicas em massa e de célula única.

A utilização dessa nova tecnologia e suas vertentes traz consigo novos paradigmas, entretanto pode auxiliar na reconstituição do microambiente tumoral e diminuir as lacunas existentes entre os cenários in vivo e ex vivo.

Em uma edição especial da revista Câncer Biomarkers foram compilados diversos estudos retratando as abordagens e análises dos desafios da utilização da inteligência artificial e suas vertentes para aprimorar a capacidade de previsão de biomarcadores de câncer e outras doenças.

Entre as aplicações mais promissoras apontadas por essa edição especial está o estudo da caracterização do microambiente tumoral, além da predição da resposta a imunoterapia e outros aspectos.

A principal vantagem desses estudos tem sido a representação dessas características e experiências in silico, ou seja, através de simulações computacionais, e a principal dificuldade tem sido a escassez de dados. 

Essa escassez não é referente ao que se sabe sobre os tumores, apesar de muito ainda precisar ser descoberto, mas sim na capacidade de reunir bancos de dados que sejam grandes o suficientes para a análise ser efetiva e não tendenciosa a determinada população.

Conclusão

Cada vez mais o estudo tumoral tem apresentado novas características e associações encontradas nas células tumorais para o desenvolvimento do tumor. Novas pesquisas têm demonstrado ainda mais o quanto este estudo é multi e transdisciplinar incorporando os mais diversos aspectos para a compreensão desejada.

Direcionar o estudo para a combinação de dados clínicos-patológicos (tumorais, metastáticos, sistemas de estadiamento), imagens, status genéticos e interação com o microambiente tumoral como diretrizes para o tratamento de diferentes tipos de cânceres pode ser a única forma de realmente conseguir uma compreensão mais ampla sobre o desenvolvimento dos diferentes tumores.

Especialmente porque os tumores cada vez mais podem ser considerados como uma sociedade tecidual, onde existe essa associação entre os diversos componentes para que ocorra a sua sobrevivência.

De certa forma, observa-se que as células tumorais em seu ambiente influenciam tanto na formação do microambiente tumoral, mas também no recrutamento de células circulantes para o crescimento e disseminação do tumor.

Sendo assim, se faz necessária a busca pelo desenvolvimento de terapias eficazes contra os tumores. 

Além disso, a utilização do microambiente tumoral como alvo terapêutico pode ser fundamental para compreender a influência das células não tumorais e os componentes não celulares presentes nesse ambiente. 

Visto que esses componentes tanto celulares como os não celulares apresentam uma alta complexidade em sua relação além de fenótipos heterogêneos e dinâmicos.

Dessa forma, sinalizando um dos grandes desafios, o fato de que várias células ou componentes não celulares poderem apresentar relações contraditórias com as células tumorais. Ou seja, a mesma célula pode apresentar características de ação pró e antitumoral.

Sendo assim, se torna imprescindível desvendar importantes lacunas na compreensão desses componentes e a relação que possuem para a atividade tumoral, podendo ser um importante alvo para o tratamento tumoral.

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